Eu vi sabendo o mínimo possível, na verdade eu nem assisti ao trailer (vi depois, por curiosidade), só sabia que era terror e que a garota estar naquele local era uma péssima ideia. Mas por que? De onde virá o perigo, eu me pergunto durante os primeiros minutos, enquanto não sei se posso baixar a guarda por um momento. Vem do estranho na casa? Que com todo o direito de estar lá, é ao mesmo tempo um intruso? Sim, só que não! Vem da vizinhança? Que apesar de pertencer a uma cidade grande, está mais deserta do que muita cabana na floresta? Mais ou menos, depende de que porção geográfica do bairro estamos falando. Trata-se de um complô para manter gente demais na casa, sem que haja um acordo entre as partes? Bom, um esquema para manter gente naquela casa a contragosto, existe! Só que Tess, nossa heroína de vez em quando, pode se encontrar no meio disso apenas por incompetência de péssimos profissionais. O dono do local não presta? Não… mas de qual imprestável estamos falando? O que se sacrifica para não lidar com consequências, ou o que sacrifica os outros para salvar a própria pele? Este filme é caótico? Pode apostar, só que apenas os personagens estão dentro do caos, enquanto a direção permanece inabalável.
O plot e eu vou tentar replicar minha própria experiência, não revelando pontos chaves da história, é o seguinte: Uma jovem provavelmente ludibriada pelo Trivago ou um site similar, precisa dividir a casa com reserva dupla por um dia, com o cara que faz no novo palhaço do It – A Coisa (2017). Uma entrevista de emprego a espera na manhã seguinte, portanto não é uma pessoa endinheirada para ter opções, além de passar um tempo na companhia de Bill Skarsgard e que toque de gênio foi a escalação dele, naquela noite chuvosa e naquele lugar esquisito. O pior é que é um trabalho com audiovisual, a minha área, então não tem dinheiro mesmo e eu acho bem curioso, entre diversas coisas curiosas deste filme com pouca gente, que tantos sejam profissionais do entretenimento. São três, se contarmos com o cineasta amador, entusiasta do Home Vídeo.

É raro, eu me lembro de ter visto algo similar em O Sinal (2007), mas o diretor interrompe o terror no ápice, duas vezes, muda completamente o tom do filme e depois resume a história, sem nem pedir licença. Há uma troca de protagonistas completamente inesperada, mas não permanente ou desprezada por quem assiste. É uma das artimanhas que tornam o filme inesquecível. Mais raro ainda, é usar uma vizinhança inteira como cenário de terror, quando não se trata de um lugar fictício e em uma cidade grande ainda por cima. Noites Brutais se passa em Detroit, uma vez o centro das indústrias americanas e agora abandonada, depois que muitas empresas faliram ou simplesmente se mudaram. A luz do sol, não ameniza a sensação de medo, porque no subúrbio onde Tess se enfiou, nenhuma outra casa está habitada ou se encontra habitável. Que ótima ideia fazer um filme de terror naquele lugar. Se eu não me engano, as cenas urbanas de The Walking Dead também foram gravadas na cidade, nas primeiras temporadas.
Tess faz tudo direitinho. Ela cogita todas as possibilidades antes de entrar na casa já ocupada. Ela recusa o chá que não viu ser preparado, aceita o aposento para dormir com uma porta que ela pode trancar. Conversa com o estranho de uma maneira educada e amigável, sem se esquecer de registrar a identidade do rapaz, só por precaução. Consegue sair e voltar para a casa alugada sem um arranhão, entrando na residência antes do dependente químico designado para aquela rua conseguir alcançá-la, com uma junção suspeita de frases que podem ser interpretadas como uma advertência ou como uma ameaça. Aí uma coisa simples acontece, bem idiota mesmo. Ela precisa ir ao banheiro, não tem papel e ela encontra o item no porão… e outro porão dentro do porão.

O filme brinca com as nossas expectativas o tempo todo. Logo nos primeiros segundos, vemos um movimento de câmera discreto, mas engenhoso e digno de super produções, enquanto achamos que estamos prestes a assistir a algo de orçamento modesto. A trilha sonora escandalosa, que a gente só nota quando ela cessa abruptamente, é um dos diversos momentos bem humorados, em que podemos não estar rindo alto com o filme, mas com certeza um sorriso largo está se abrindo. Após a primeira mudança radical no enredo de Noites Brutais, com o coração ainda acelerado, o clima fica tão leve, tão de repente, que a nossa ansiedade parece até o resultado embaraçoso de uma pegadinha, mesmo que a gente saiba que o terror vai voltar. O tempo inteiro temos sensações mentirosas de tempestade e calmaria. O desfecho quase acontece diversas vezes, sempre com um final superado em maluquice pelo final seguinte, mostrando que o desconhecido diretor Zach Cregger, sabe conduzir seu roteiro original e cheio de reviravoltas com pulso firme e um entusiasmo muito bem vindos.