DIrigido por George A. Romero
DIrigido por George A. Romero

Para escapar de zumbis famintos por carne humana, um grupo de estranhos se esconde em uma casa isolada.

Foi o início de muita coisa relevante no cinema de terror. Desde mortes inesperadas de mocinhos logo no começo do filme, até um ator negro assumindo o papel principal. Outra bela e inventiva ousadia, é a mistura do estilo habitual de filmagem ao estilo documental, em cenas que simulam um noticiário de tv. Mesmo em preto e branco, geralmente um alerta de velharia na tela, nós vemos crianças inocentes e mocinhas indefesas pagando pelo descuido alheio. Vemos até gente nua praticando canibalismo. É um filme feito com pouco dinheiro (um dos financiadores era um açogueiro que contribuiu com carne crua e intestinos), mas com muita inspiração.
Eu devo confessar que assisti primeiro ao remake de 1990, na verdade, aquele foi o primeiro filme de zumbis que eu vi. A paixão foi instantânea, mas ao contrário daquela, esta versão de A Noite dos Mortos Vivos sempre quis ser levada a sério. A maquiagem dos mortos é discreta, e não é só por conta do baixo orçamento. Romero gosta de usar o gênero para panfletar. Você sabe que um filme de terror é meio político, quando o zumbi pega em armas brancas antes de iniciar um ataque. Não existe um alvo específico e é extremamente desorganizada, mas trata-se de uma revolução. Devorar os humanos é apenas uma consequência da matança. Eles não respiram, se você respira, é um inimigo para eles.
night-of-the-living-dead 2O filme começa com Johnny reclamando dentro do carro, por ser uma viagem de seis horas, ida e volta, de casa até o cemitério onde o pai está enterrado. Barbra, a irmã dele, é um pouco mais agradável por ser menos egoísta, mas isso não importa. O que fica claro no universo que Romero está criando, é que personalidade não condena nem salva ninguém, apenas sorte. O que era para ser uma obrigação chata para um e um momento de reflexão para outro, se transforma em um interminável inferno. Johnny, o fanfarrão que por costume deveria ser o herói, acaba sendo a primeira vítima, deixando Barbra sozinha no pesadelo. O filme segue e a mocinha da história jamais se recupera, se tornando um peso morto para outros sobreviventes. Este foi o modo que o diretor escolheu para nos avisar, décadas antes de zumbis se tornarem uma mania, que gente morta se levantando iria gerar muito mais trauma do que diversão.
Barbra consegue escapar para uma casa inabitada com bastante dificuldade. Para um iniciante sem grana, trabalhando quase que exclusivamente com amadores, Romero demonstrou muito talento para criar tentativas de fuga cheias de tensão. Ele prova que é muito difícil se livrar de apenas um zumbi, mesmo na época em que eles eram mais lentos. O que o diretor ainda precisava aprimorar era a condução de cenas com bastante diálogo. O filme foi cortado pelos distribuidores, de uma forma até grosseira em certas partes, mas eu não os condeno. Eu entendo que diferentes personagens tenham visões distintas sobre a causa de tudo e sobre quais ações são mais seguras, mas com dois minutos a menos de falação no tempo total do filme, o rítmo ficaria bem melhor.
night_of_living_deadA moça não fica sozinha por muito tempo, porque Ben aparece na casa e ele é tudo o que esperamos de um protagonista. Calmo, inteligente e prático, ele já chega com estratégias e planos de fuga, que são respeitados por quem tem respeito por boas idéias, independente de ser os anos sessenta e de Ben ser um homem negro. Logo outros sobreviventes surgem e se unem em um projeto que envolve fortificar a casa, e escapar dela, caso a “fortaleza” não se mantenha. Ben não é um líder perfeito, graças a Deus! Ficou combinado, ou subentendido entre realizadores e platéia, que deste filme em diante, homens como ele não precisariam ser. Ben não precisa compensar por nada, ele é um sobrevivente apavorado como outro qualquer.
Eu não queria adicionar atributos ao filme apenas pelo tempo de existência e pela fama, mesmo porque, esta é uma obra que não necessita de defesa. Existe uma história bem contada e cheia de imprevistos aqui, para garantir uma posição de respeito em qualquer ranking de classificação de bons filmes de terror, mas eu temo que alguns membros do público de hoje, ignorem a importância histórica deste filme. Romero é com certeza o patriarca de uma família em constante decomposição, que nunca se contentou com a noite, e criou uma madrugada, um dia, uma terra, um diário… ele foi a inspiração e é a razão pela qual os mortos vivos existem do modo como os amamos. Qualquer carência de cenas chocantes, acontece mais pela nossa bagagem cinematográfica moderna, do que por pudor do diretor. Se não há muito sangue, ainda tem muitas cenas que serviram e servem de referência para o terror desde então.