É um prazer simplório, mas é todo meu, ver o logo de abertura dos estúdios se adaptar ao filme a ser exibido. É uma surpresa que causa desconforto e estranheza (as sementinhas do terror), quando uma imagem que conhecemos tão bem de maneira imparcial, a serviço de qualquer gênero, como o leão da MGM ou o globo terrestre da Universal, é adaptada não apenas ao terror, mas ao tema do filme. Uma trilha sombria teria completado tão bem o serviço, mas Paul W.S. Anderson, responsável por todas as sequências de Residente Evil com a esposa no papel principal, nunca foi, com bons e maus resultados, um diretor sutil e ele me enfia uma música tribal na transição entre a montanha da Paramount e o cosmos. Não me entendam mal, eu sempre adorei este filme, mas existem algumas bolas-fora que não posso deixar passar: O engenheiro surtou e foi sedado, mas ninguém pensou em imobilizá-lo na maca, caso ele acordasse ainda em crise? Ninguém consegue dominar ou despistar um vilão sem olhos? A temperatura da nave é congelante, mas encontram água ainda está em estado líquido, fazendo barulhinho dentro da garrafa que gira na gravidade zero? Sim, eu sei que é pêlo em ovo! Eu não posso nem reclamar muito do comportamento despreparado, inapropriado e arrogante de alguns profissionais top de linha, já que este era o melhor gerador de conflitos em filmes dos anos 90.
Quando conhecemos o Dr. Weir (Sam Neil), o especialista recentemente viúvo e… instável, ele já está a bordo da Lewis and Clark, sendo o único completamente ciente da real missão da nave de busca e resgate. É a tarefa dele, um veterano da ciência, mas novato entre os astronautas, revelar a uma tripulação incrédula que o seu maior orgulho profissional, a nave Event Horizon que havia desaparecido perto de Netuno há anos, voltou a transmitir um sinal para a base de comando. A equipe está exausta e deveria estar de férias naquele momento, porém o que está causando um clima de hostilidade e apreensão, são os sete anos passados entre o sumiço e o reaparecimento do maior objeto voador já construído até então. Do áudio quase indecifrável que lhes foi fornecido pela Nasa, junto com o objetivo de interceptar e investigar a nave, apenas uma voz humana pode ser distinguida e ela recebe destaque pela frase pronunciada em Latin: “Liberate me”, uma espécie de S.O.S. dos tempos de Julio César. Não há como ignorar.

Todo mundo sabe que efeitos especiais possuem um prazo de validade, mas não há muito do que reclamar. A nave que carrega o nome do filme, é monstruosamente maior do que a Lewis and Clark e este conceito de Davi versus Golias, juntos com outras ideias atemporais no filme são o que realmente importam. Anderson estava disposto a fazer um “O Iluminado (1980) no espaço” e ele teve sucesso em vários aspectos. As sensações de opressão, isolamento e desespero estão lá e estas são coisas que não expiram. A Horizon é a representação do Hotel Overlook, com direito a uma repentina e assustadora inundação de sangue, assim como um vilão vira-casaca. No campo das ideias que funcionam além do tempo, o mesmo vale pelo menos por enquanto, para os equipamentos vistos como futurísticos, que são realmente úteis e indispensáveis naqueles ambientes e condições (exceto pelo armazenamento de dados em cd, isso foi mancada).
A nave gigante é um pesadelo gótico em cada um dos seus compartimentos. De vez em quando lembra a capa de um álbum de death metal, de tão exagerada, mas o que eu sei sobre design de interiores em 2047? Ela foi criada com o propósito ambicioso de superar a velocidade da luz, dobrando as estruturas de espaço e tempo para se locomover entre grandes distâncias no Universo instantaneamente. Quando o resgate chega não há sinal de vida, mas muitas evidencias de selvageria. Paredes sujas com resíduos de pele e sangue, em uma quantidade extravagante, sugerem o que pode ter acontecido com a antiga tripulação. Alucinações se manifestam de maneira geral e fica difícil até mesmo para o comandante, vivido por um jovem e já competente Lawrence Fishburn, manter a calma entre os companheiros. Antes que eles tenham tempo para entender que são o próximo alvo, a nave de resgate sofre uma pane e não sobra muita escolha. Se quiserem sobreviver nas próximas horas, terão que abandonar o certo, quero dizer, o quebrado pelo duvidoso decorado pelo Pin Head.

O Enigma do Horizonte não economiza no pessimismo e faz uso de tudo o que poderia potencialmente dar errado numa missão como esta. Quando vi o filme pela primeira vez, eu acredito que não era a única a ignorar as consequências físicas assustadoras, de um astronauta fora da nave sem o equipamento apropriado. Não tem sutileza aqui e não são poucas as cenas violentas. É claro que, quando falamos sobre O Enigma existe uma que eu considero arrebatadora, uma das mais chocantes cenas da história do terror e você sabe de qual eu estou falando. É raro que um filme consiga produzir uma visão tão marcante do inferno, com total ausência de pudor, ordem e razão. Se eu tiver uma reclamação legítima, uma que não é pêlo em ovo, é que esta cena é curta demais. Depois de uma espiada na terra do capeta, o resgate só quer ir pra casa, mas a Horizon quer voltar para onde considera ser o lar definitivo. Quem vencerá? Davi ou Golias?