Tudo o que um filme sobre Ouija deveria ser!

Eu estava envergonhada de admitir que tinha parado o filme no meio, porque o via tarde de noite e ele estava ficando assustador demais para o horário. Nós assalariados nem sempre precisamos dormir cedo, mas precisamos dormir! Larguei no meio uma cena que estava me deixando nervosa e terminei o filme na manhã seguinte, mas pelo que eu descobri na internet, não fui a única a ver o filme em duas partes. Só que a cena-limite varia de pessoa para pessoa, neste filme repleto de medo, a minha foi um demônio aparecendo no corredor do apartamento. Caramba, conferindo agora, eu não tinha nem chegado na metade! Verónica é uma surpresa e tanto, lançada sem alarde nenhum no Netflix, sob a direção da outra cabeça criativa por trás da série Rec, Paco Plaza.

Na história, Verônica (vamos traduzir o acento, para distinguir filme de personagem) é uma adolescente com uma ideia perigosa na cabeça. Durante a passagem de um eclipse, enquanto toda a escola estiver no terraço e nas janelas observando o fenômeno, ela e mais duas alunas estarão no sótão, cercadas de velharias e poeira, entretidas com uma tábua de Ouija, símbolo de diversão para toda a família em qualquer filme de terror em que apareça. Uma das meninas quer entrar em contato com o namorado que se foi, outra está ali pela experiência e Verônica quer conversar com o pai. Em um determinado momento da jornada sobrenatural de Verónica, que vai do momento em que as garotas ascendem as velas, até a ligação desesperada para a polícia três dias depois, o pai dela aparece, mas não era nada do que ela estava esperando e o espírito dele não foi o único que se sentiu bem vindo na macumbinha clandestina das jovens.

VERONICA 1

Ana, a mãe de Verônica, é interpretada pela atriz Ana Torrent e quando eu a vi, lembrei da frase icônica: “Me llamo Angela, me van a matar” da obra prima Tesis – Morte Ao Vivo, filme de estreia de Alejandro Amenábar que você também encontra aqui neste blog. Só que a estrela de um dos meus filmes de terror favoritos, é aqui uma viúva que trabalha até muito tarde e precisa deixar nas mãos da filha adolescente o papel de heroína da casa. Verônica é quem coordena toda a atividade doméstica, se certificando de que os três irmãos mais novos cheguem à escola limpos, alimentados e no tempo certo, enquanto a mãe ainda está dormindo, além de cuidar da roupa, comida e limpeza. É com ela que os pequenos falam sobre os trabalhos escolares que precisam ser providenciados. Quando eles chegam da escola é Verônica quem verifica quem tem lição de casa, é ela quem faz o jantar e quem dá banho em quem ainda não consegue se banhar sozinho. Os filhos precisam dar uma passadinha no bar onde a mãe trabalha durante o expediente, senão não conseguem vê-la. Verônica é a mãe no momento. Se a jovem se distrai dos seus afazeres, é só porque está admirando de longe outra adolescente que vive sem tantas responsabilidades. Coitada, é claro que ela buscava pelo pai!

A vida familiar de Verônica parece bem real e isso é o que faz a diferença neste filme. A casa tem uma dose saudável de bagunça, como as casas de todos nós. Se a mãe estiver muito ocupada no bar, ela vai mesmo ignorar a molecada e jamais ser considerada uma mãe ruim por nenhum de nós. Ana recebe o passe livre das mães de verdade. Os irmãos mais novos são tão espertos quanto a idade permite e não o roteiro. Esse clima de autenticidade, de gente comum que encontramos na vizinhança, ou no caso aqui, no noticiário, é o que dá força a qualquer acontecimento anormal dentro da casa. Mas por mais que Plaza saiba dirigir, o mérito não é todo dele. Verónica é baseado em uma história real de 91 na Espanha, com direito até a fotos oficiais da casa original para quem quiser ver e um relatório policial verdadeiro, que pode ser encontrado online em espanhol, com relatos sobre os acontecimentos pelas palavras de profissionais da lei considerados sérios. A precisão nos detalhes é tanta, que não só datas específicas como os horários das ocorrências são destacados no filme.

VERONICA 2

Uma força sinistra invade a casa de Verô, como todos a chamam, e a jovem não sabe como se livrar do problema. Ela tenta crucifixos e desenhos de uma padronagem supostamente protetora, e é a única das três adolescentes a ser assombrada pelo espírito malígno. O ser quer destruí-la, talvez também dar fim em um dos irmãos pequenos, mas não sem antes atormentá-la até que ela pareça maluca em poucos dias. A situação é assustadora, mas fica mil vezes pior por ser realista e na vida real, se alguém diz ou se comporta como se estivesse prestes a ser possuída, as pessoas ao redor simplesmente se afastam. Verô está sozinha, como já está há algum tempo, só que “acompanhada” de alguém que não quer. A única boa notícia, é que ela estuda em um colégio de freiras e atualmente um filme de terror com freiras, tem a chance de possuir uma irmã meio caduca e cheia de informações importantes vindas do além. O filme tem cenas de sonhos e alucinações super criativas e os efeitos especiais não são exagerados. Eu só recomendo que você o assista de manhã, se puder, apesar de que ver a segunda parte do filme bem cedo, não foi tão eficaz quanto eu esperava para dormir naquela noite.