Beth está passando por um doloroso e repentino luto, após o suicídio do marido. Ela acreditava ter um bom casamento, acreditava que os dois eram felizes juntos e realmente não haviam motivos para que ela duvidasse disso. Sem problemas financeiros ou de saúde, amor em abundância. O que deu tão errado? Deve ser devastador, descobrir que não se tem a mínima idéia do que se passava na cabeça de um ente querido, que não demonstrava nenhum sinal de depressão e ainda assim comete um ato tão infeliz. Ele deixou um bilhete de despedida, mas o texto breve só faz menção à uma disputa amigável entre o casal. Owen acreditava em espíritos, Beth, era cética desde um acidente na adolescência que quase tirou a vida dela. Ele escreveu que ela estava certa, que não há nada no além e não tem ninguém atrás dela. É a coisa mais estranha que alguém como ele, poderia dizer a alguém como ela, antes de tirar a própria vida.

O diretor David Bruckner, de O Sinal, O Ritual e do mais recente e ótimo Hellraiser, parece ter escolhido o terror como moradia permanente e sabe como uma casa mal assombrada deve ser. Cheia de janelões, rústica e de frente para um lago, a propriedade se venderia sozinha eventualmente, porque a agora única moradora não quer mais viver na casa projetada e construída pelo marido, só que existe uma grande pergunta sem resposta segurando Beth no local. Para quem é obrigado a estar com ela durante a dor, a tristeza e eu estou falando de nós assistindo a tudo, é incrível o que pouca luz e uma tragédia fazem para mexer com a nossa percepção. Aquele lugar bonito, pacífico e obviamente caro durante a luz do dia, se torna o ambiente mais perigoso do mundo, mesmo que a gente não saiba o que pode acontecer quando anoitece. Num momento de muito medo, até a viúva solta um: “Eu queria que já fosse de manhã”. Nós também, Beth e teríamos picado a mula daquela beleza de habitação, quando o aparelho de som ligou sozinho pela primeira vez, tocando a música tema do casamento deles, com o volume no talo, mas lá está ela, na esperança de que seja uma mensagem menos vaga do que o bilhete. 

A Casa Sombria é uma investigação sobrenatural, realizada por uma amadora apavorada com a ideia de não ter sido amada de verdade. Entre imagens felizes de outros tempos, gravadas nas fitas pessoais do casal, que ela não consegue parar de assistir, Beth bebe muito, se irrita, pesquisa modelos de armas de fogo e quando cai no sono, tem pesadelos assustadores. Dos filmes que eu vi de Bruckner, este era para ter sido aquele com a narrativa mais ordenada, porque se colocarmos o enredo em uma frase: “Mulher começa a ver assombrações após o suicídio do marido”… parece algo simples de ser apresentado, mas o filme é bem mais complexo, exatamente porque a descrição verdadeira não é essa. O tempo inteiro, o mundo dos sonhos invade o mundo real e fica difícil saber se Beth passa por uma experiência paranormal legítima, ou se está dormindo. Até a noção do tempo fica confusa, apesar de que progressões sempre acontecem na história, toda vez que um objeto que virou herança, chama a atenção e se torna uma pista. Ela precisa descobrir se os sentimentos eram verdadeiros. Se ele possuía uma mente perturbada e escondia muito bem. Se ele tinha vida dupla, ou uma amante. Se ela tem alguma parcela de culpa na fatalidade. Quem procura acha e ela vai achar. Depois vai desejar ter permanecido na ignorância. 

Se as aparições são verdadeiras, eu amei como elas se manifestaram! Uma entidade começa a se comunicar. Ela move coisas, fala, toca em Beth, mas quando o contato é visual, é menos explícito e mais familiar do que se espera. Como os falsos fantasmas de infância, que ganhavam formas humanas por acidente, com a junção de objetos no escuro, olhados por um determinado ângulo. A Casa Sombria brinca com percepções e gosta de amontoar integrantes no filme, só para despistar e confundir quem quer que seja, inclusive a gente, com personagens que aparecem como figuras amigáveis, com suas interferências insistentes e preocupações excessivas, provocando a desconfiança típica de um público super acostumado com traições. Rebecca Hall está perfeita no papel da viúva, que passa uma parte enorme do filme buscando sentido em coisas que fogem do controle dela. Porém, é uma investigação tão demorada, desgastante e geradora de mais perguntas do que respostas, que o verdadeiro vilão do filme precisa chegar e se explicar, antes que o filme termine. Das duas uma: Pode ser um inimigo impaciente, que percebeu que suas pistas eram demasiadamente enigmáticas, ou que a investigadora está sempre bêbada e resolveu ajudar com o mistério, mas também pode ser a mente de Beth, derrotada, jogando a toalha e re-imaginando um fim mais romântico para o próprio casamento. Uma conclusão com a qual seu coração consegue viver.  

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