Uma repórter desconfia que o vizinho seja um serial killer.

Esses dias o bicho da nostalgia me mordeu e eu comecei a me lembrar deste filme que vi na infância. Eu não sabia o nome e como era bem novinha, eu precisei me guiar pelas lembranças que tinha de certos detalhes para reencontrá-lo. Digitei em inglês no Google algo como “jovem repórter; irmã surda, muda e cega; vizinho assassino” e depois de alguns resultados falsos, finalmente encontrei um dos filmes que mais me apavoraram na infância. Eu precisava vê-lo imediatamente, para descobrir se ele era assim tão assustador quanto eu pensava, e também para descobrir se eu tinha ficado muito esnobe para ainda sentir o impacto dele.

O filme é tão violento e cheio de mulher seminua, que eu me pergunto como fui liberada pra assistir uma obra dessas tão cedo na vida! Uma das cenas que nunca saiu da minha mente foi a de uma cabeça decepada, boiando dentro de um aquário caseiro ainda com peixes nadando em volta. Naquela época, as emissoras de tv eram bem mais vida-louca do que hoje, acredite se quiser, e não censuravam sexo e violência, independente do horário que o negócio tava passando. Eu via de tudo e geralmente começava a ver um filme sem ter ideia do quanto ele poderia ficar pesado. Meus pais eram responsáveis, mas também sabiam que impedir uma mini-cinéfila de terminar um filme no qual já estava completamente imersa, seria mais prejudicial do que cabeças rolando e seios aos montes.

Eyes of a stranger 1

A protagonista do filme é Jane, uma âncora de um telejornal em Miami. A notícia principal todos os dias, é a ação de um serial killer que está criando um caos na cidade, atacando mulheres e também homens, se eles estão por coincidência no caminho. Todo mundo fala nele, todo mundo se preocupa com ele e a fama é um grande problema para a polícia, que não tem os recursos para filtrar as denúncias que vão chegando, verdadeiras ou falsas, feitas com ou sem malícia e acaba deixando de atender chamadas sérias, como acontece com a segunda vítima que vemos no filme. Por uma mistura de cidadania, empatia pelos mortos e um trauma pessoal, Jane não consegue esconder, mesmo quando está no ar ao vivo, que está bem abalada com o que está acontecendo na cidade. Uma noite, voltando do trabalho, ela demora na garagem coletiva do prédio e observa, sem ser percebida, que um vizinho chega e troca de roupas antes de subir para o apartamento. As roupas estão um pouco manchadas, mas ele mora sozinho, então esconder uma possível traição não é o que passa pela cabeça de Jane, quando o cara olha desconfiado para todos os lados antes de jogar a roupa no lixo.

Olhos Assassinos já não tinha uma fotografia muito boa e não foi feito para ser preservado para as gerações futuras, então algumas cenas são bem escuras e um pouquinho desfocadas. O que quer dizer que as imagens que aparecem em aparelhos de tv no filme, parecem ter sido filmadas com uma batata. Em uma sequência de flashback, que graças a Deus não foi envelhecida por razões artísticas, ficamos sabendo que Tracy, a irmã de Jane interpretada pela então estreante Jennifer Jason Leigh, nem sempre foi uma jovem com deficiência. No presente, para conversar com a caçula, Jane precisa fazer a linguagem dos sinais nas mãos dela. No apartamento das duas, Tracy se vira muito bem, mesmo sem poder enxergar ou ouvir. Somente na magnífica sequência final, com o assassino bem próximo, é que sentimos pena das vantagens que outras pessoas têm sobre ela.

Eyes of a stranger 2

Entre tudo o que eu guardava na memória e o que eu esqueci completamente, o fato do assassino não ser um mistério foi o que mais me surpreendeu. É impressionante o quanto o homem é presente fisicamente no filme e o quanto isso não remove o ar ameaçador que o cara carrega. Stanley, sim esse é o nome dele e ele é um dos maiores vilões da minha infância, é um cara meio relapso, rechonchudo, que não parece ser muito forte, e que lembra um pouco o George do Seinfeld, ou seja, não o assassino típico de um filme de terror e esse talvez seja o seu maior trunfo. Ninguém o vê pelo que ele é, exceto por Jane que sem apoio ou argumentos plausíveis para conseguir algum, começa a realizar uma investigação amadora e perigosa pelo condomínio. As mortes são bem teatrais, surreais quase, assim como a sequência de ação envolvendo Jane dando uma de Tom Cruise, mas uma coisa é certa: com toda a sinceridade, eu não me senti crescida demais pro filme não e ele continua valendo a pena pra mim!