Um slasher criado para ser curtido e comentado.
Em Rosedale, uma cidade interiorana dos Estados Unidos, um maníaco está há um bom tempo matando moradores sem chamar muita atenção. Alguns desaparecimentos sem evidência de violência ou conexão entre os sumidos, algumas mortes bem sangrentas que são interpretadas como acidentes e pronto, a polícia não tem a mínima ideia do que está acontecendo e o mascarado sanguinário está livre e sossegado para agir. A única esperança da cidade está com Sadie e MKay, duas adolescentes que, mesmo com o celular grudado na cara pela maior parte do tempo em que estão acordadas, já se ligaram nos acontecimentos e criaram um plano que capturou o serial killer. O problema, é que a intenção das garotas é usar o experiente assassino como um instrutor, para aprender com ele e fazer melhor.
Se o filme é uma paródia, ela está menos relacionada ao cinema e mais à vida real. Claro, assim como Pânico que fez do terror dos anos 80 a base tanto para a piada quanto para a imitação, Tragedy Girls também usa os slashers para mostrar o quanto esta vertente do terror necessita de sorte, da incompetência das autoridades e da ingenuidade do público para encarar absurdos com a mente aberta. Duas garotas mignon, tentando dominar vítimas bem maiores na base da porrada, garante cenas hilárias no filme. Mas o foco da observação do diretor é a nossa realidade, com atenção especial à recente e crescente obsessão mundial com a pseudo-fama, alcançada através de curtidas nos Instagrams da vida. As duas jovens até gostam de matar mas meu Deus! Como é bom manipular a opinião pública para conseguir popularidade, se vinculando sem constrangimento às tragédias de gente que elas mal conhecem.
No começo, ainda um pouco amadoras, Sadie e MKay possuem a habilidade e disposição para matar, mas muita dificuldade para criar a ideia de um assassino em série. As mortes são meio bagunçadas e podem muito bem continuar sendo consideradas acidentes, como era a intenção do assassino original que só queria “trabalhar em paz”, a não ser que as garotas se tornem mais cinematográficas com a apresentação das suas vítimas. Tripas, decapitações e criatividade dão início, finalmente, ao Maníaco de Riverdale, para o desespero dos policiais e para o divertimento da molecada, que faz do fenômeno o assunto principal das rodinhas de fofoca, sem nenhuma alteração nos hábitos de segurança. Com a ajuda da edição de vídeos do talentoso filho adolescente do xerife, o site de Sadie e Mkay, dedicado à teoria de um assassino a solta na cidade desde antes da confirmação oficial, explode em acessos.
Sem as obrigações sociais, morais ou o mérito da polícia, Sadie e Mkay acabam se tornando a principal fonte de informações na cidade, sobre os crimes que elas mesmas estão cometendo. O homicida original se torna um prisioneiro das meninas e elas continuam o trabalho dele, enquanto viram mini-celebridades ganhando um público cada vez maior. Até a imprensa prefere entrevistar as garotas primeiro e depois qualquer um envolvido nas investigações, assim que um corpo é encontrado. Inatingíveis, invencíveis, com a faca (a foice, a motoserra, o martelo, o machado…) e o queijo na mão, as meninas são duas estrelas em ascensão. Mas como a notoriedade atrai muitos olhos e o ego de uma sociopata, ou no caso duas, não pode ser controlado, a queda das garotas pode ser apenas uma questão de tempo.
O filme é uma comédia de terror, que não permite que o público sinta pena de nenhuma vítima. O tema principal é uma caricatura, mas infelizmente, a lambança que permite o sucesso de duas jovens tão perversas não está muito longe da realidade, com o narcisismo que impera nas plataformas de interação online. Estamos tão próximos que nos tornamos cada vez mais distantes, como dizem os especialistas, mas Tragedy Girls consegue criticar o comportamento de gente comum nas redes sociais, sem que a responsabilidade pelos assassinatos seja transferida das duas culpadas. As vítimas são escolhidas por Sadie e Mkay na base da picuinha e é muito interessante ver, do ponto de vista do assassino em um slasher, que quem merece morrer são realmente os clichês como o bonitão, o valentão e a cheerleader. Quando as meninas percebem que fama é uma maravilha, mas que sangue é melhor ainda, o diretor interrompe o discurso de quem há muito tempo tenta culpar o entretenimento pela violência. As distrações certamente não colaboram, mas estão longe de serem a causa.