
Um garoto descobre que o irmão dele é um serial killer.
Marty não parece, pelos segredos de família que já descobriu e pelo sofrimento que suporta com o bullying na escola, mas ele ainda é bem novinho. Quando ele abre a bolsa de boliche do irmão, sabendo que irá encontrar uma cabeça humana dentro, é uma cena perturbadora. Ele tira a cabeça da bolsa e a examina com as mãos protegidas por luvas de limpeza, mas não há desrespeito. Não é uma cena feita para provocar uma audiência mais sensível. Marty é o narrador da história, ele é só coração e aquele ato representa o mais próximo que a vítima terá de um velório.
O assassino é Steve, o irmão mais velho de Marty. Um daqueles adolescentes anti-sociais, cheios de raiva mal direcionada e cabelo na cara. Se a gente não soubesse o que ele anda aprontando, ele não pareceria tão perigoso quando se irrita com alguma futilidade. Ele é realmente um adolescente típico antes de mais nada, afinal, que tipo de serial killer conserva partes de suas vítimas em casa, quando ainda mora com os pais? O tipo irresponsável, é claro, que não recolhe nem a toalha molhada de cima da cama. Mas se engana quem pensa que as ameaças de Steve são vazias, como as de gente comum. Ele é um monstro e inexplicavelmente racista.
Os dois são grandes fãs de filmes de terror, maiores do que eu, assistem a qualquer coisa para julgar depois, algo que o meu cinismo não permite. O aluguel de fitas de VHS, contudo, é uma preferência que eu não consegui entender. Enquanto Steve foi descaradamente influenciado por um slasher, usando o look e modus operandi do vilão fictício em suas próprias matanças, Marty serve como defesa do nosso público. Ele é o resultado positivo do terror em uma mente saudável. O máximo que ele tira de inspiração é a criação de uma HQ do gênero, em parceria com um amigo da escola. Mesmo com pouca idade ele já entende o que está vivendo e se expressa com arte. Found é como uma história em quadrinhos onde o vilão e o herói tem o mesmo histórico familiar, cultivando uma relação ao mesmo tempo de repulsa e de proximidade.
Found tem sérios problemas. Apesar de nunca ter sido um empecilho para muitas produções indie, a falta de dinheiro transparece nas escolhas da produção. A história é muito interessante, mas fica comprometida com uma edição extremamente amadora, planos de câmera de tv (não dos melhores programas) e atuações irritantes. É como se eu tivesse um bom roteiro nas mãos e chamasse somente meus vizinhos para fazer um filme comigo, sem me preocupar se algum deles tinha experiência com cinema. Os erros de continuidade serão percebidos na primeira assistida e com exceção do ator mirim que faz Marty, ninguém no elenco faz um bom trabalho. A gente até perdoa os coleguinhas de classe, mas os atores que interpretam os pais dos garotos, os professores, pais de alunos e até o pastor… não dá para ignorar quando a história nem sempre nos prende, por causa da falta de crença nesse povo. Eu já vi atuações melhores em filmes bem piores e isso dá uma raiva!
Quando o filme começa, Marty já sabe que o irmão encontrou o pior modo de lidar com os instintos violentos. Ele ainda não. O menino é inteligente, um pouco tímido e pacato. Por alguma razão ele virou alvo de brincadeiras humilhantes na escola, que estão ficando cada vez mais perigosas e ameaçando o espírito bondoso do rapaz. Após um incidente no banheiro da escola, Steve oferece ajuda e este é o dilema do jovem herói por um bom tempo. Ele quer se livrar do problema, mas sabemos que o que Steve faz o apavora, enoja e entristece. Em nenhum momento Marty cogita entregar o irmão para as autoridades, porque ele acredita que Steve tenha duas personalidades e que com amor e compreensão, a melhor personalidade irá vencer. É um erro. O que o filme nos mostra, é que não existem serial killers úteis, que matam respeitando um código. Não importa o que a tv tenha dito para você.
Found no futuro, fará parte de muitas listas de filmes perturbadores e não apropriados para o grande público. Isso acontecerá porque, primeiro, ele ainda não é famoso o suficiente para ser controverso e segundo, existem realmente filmes de terror pesados e existem filmes como este, que adicionam uma tonelada a este peso. Todas as dificuldades da produção serão esquecidas, toda a frustração com os erros não vão importar nos últimos dez minutos do filme. O final contém cenas de derrubar os queixos mais firmes e é uma tremenda surpresa (fica a seu critério se a surpresa é boa ou ruim), não só porque o tema do filme já ultrapassava alguns limites, mas também porque por todo o filme, nem chegamos a testemunhar Steve matando alguém… como antecipar que tudo acabaria tão mal?