Dirigido por Christopher Smith
Dirigido por Christopher Smith

Uma viagem de barco se transforma em um interminável e repetitivo pesadelo.

 

 

 

 

 

Christopher Smith ainda tem uma filmografia curta e pouco conhecida, mas o nome dele precisa ser memorizado. Em seus filmes, somos sempre enganados com a premissa de que não veremos nada além de um terror formulaico, que será esquecido assim que os créditos finais aparecerem na tela. Trocando aos poucos, medo por gargalhadas, como fez em Mutilados, ou fazendo do público tão crédulo quanto os cristãos da época das cruzadas em Morte Negra, Christopher nos leva para longe do terrores triviais, que as capas dos seus filmes sugerem que eles sejam.

Triângulo do Medo começa como muitos outros. Uma viagem entre amigos, para fugir da rotina no final de semana. Eles não vão longe, para a minha surpresa. Morando em uma cidade litorânea, eles se aventuram em um barco que serve de moradia para um dos amigos. Este continua na rotina, mas a distração dele é loira, atlética e o trata como um amigo.

Antes de sair para velejar, o diretor nos mostra a loira se preparando para sair de casa. Jess é solteira e tem um filho autista. Aí a gente pensa, que a vida dela deve ser muito corrida e por isso, estamos vendo apenas pedaços da sua agitada manhã de sábado. Recolhe um brinquedo no chão, entra os créditos. Limpa a sujeira que o filho fez, mais créditos. Atende o chamado da campainha, mas não vê ninguém do lado de fora… mais créditos. É como se não houvesse a necessidade de atenção para essas coisas tolas. Eu sugiro que você não desgrude os olhos da tela.

Um filme sobrenatural sem fantasmas. Cheio de gente morta voltando a viver, mas sem zumbis. Onde a história se repete várias e várias vezes, mas continua avançando. Não é só no início que franzimos as sobrancelhas, quando algo foi mal explicado. O tempo inteiro é assim, mas não há chance para pensar, porque o filme tem um ótimo rítmo e logo estamos de volta à história, com uma cena de grande importância.

Triangle 1Seis aventureiros em alto mar. Seriam sete, se Jess tivesse levado o filho, mas ele está na escola, apesar de ser sábado. De repente, o vento muda, ou melhor, pára, deixando as velas sem nenhum movimento. Uma tempestade se aproxima, com uma rapidez fora do comum, mas ela só passa por cima deles, por tempo suficiente para virar o barco, matar um membro do grupo e deixar o restante à deriva.

Talvez seja a perda recente ou o instinto cauteloso da mãe com um filho especial, mas Jess, depois de algumas horas sentada nos destroços do barco, esperando por socorro, ainda hesita em se juntar aos outros, que estão embarcando em um navio, que surgiu do nada e está muito tranquilo. Um navio de verdade, não tão glamuroso quanto aqueles que cobram uma nota por água engarrafada, mas gigantesco.

O navio se aproximou do barco, mas ninguém os recebeu. Não há tripulação, ninguém saboreava o banquete ainda fresco que os resgatados encontram. A decoração é antiquada e um vulto se desloca de um lado para outro, mas não existe assombração. O nome do navio é Éolo, em homenagem ao deus grego dos ventos, que não cumpriu uma promessa com a morte e foi condenado a rolar continuamente uma pedra montanha acima, só para vê-la deslizar de volta, quando chegasse no topo. Essa informação é contada por um dos personagens, como se fosse descartável.

A história é um quebra-cabeças que o diretor montou errado, de propósito, para que a gente tente consertar e continue tentando até depois do fim do filme. Tropeçamos em informações, que não pertencem ao momento em que elas aparecem. A ausência de algumas explicações, nos confunde. Até que percebemos que tudo está em seu devido lugar, porque o tempo no filme, está relacionado a quem vive a história e tem gente demais vivendo a mesma história. Mas chega de filosofar. O vulto se materializou em um maluco mascarado, metendo bala na turma toda, menos em Jess, que escapou por um triz.

Triangle 2Eu vou tentar deixar os rodeios de lado (não prometo nada), porque não dá pra continuar o texto, sem fazer algumas revelações. Jess, depois de derrotar o assassino, não precisa se preocupar com a solidão. Seus amigos aparecem vivos, do lado de fora do navio, em cima dos destroços do barco novamente. Ela os vê de longe, pedindo ajuda, e outra Jess está com eles, com a mesma carinha desconfiada.

Depois de um certo tempo e de certas condições, tudo volta a estaca zero. O filme faz um loop. Isso acontece várias vezes, até para a sobrevivente, que é sempre a mesma sobrevivente e não consegue parar de se multiplicar, toda vez que a história se repete, trazendo os amigos e mais uma Jess a bordo. Acompanhamos no entanto, apenas uma versão dela, que acompanha e interage com as outras.

Bem que eu tentei parar com os rodeios, mas não dá. O filme é um enigma, que pode ter início e fim, mas a história só tem o meio, o mesmo meio. Uma hora todos precisam ser salvos, outra hora, todos precisam morrer. Jess muda de personalidade de acordo com a necessidade, porque sabe que está em um quebra-cabeças, e que precisa ser qualquer peça para voltar para casa, voltar para o filho. O que Jess não percebe, é que não pode terminar o jogo direito, sendo parte dele, então lá vai ela de novo, tadinha, empurrando a pedra montanha acima.