Acompanhando uma curiosa equipe de gravação da Universidade de Volda na Noruega, descobrimos que pegadas de ursos das montanhas foram encontradas perto da cidade. Os universitários seguem um seleto grupo de caçadores autorizados e o clima é tenso, porque a suspeita é de que os animais estejam sendo perseguidos clandestinamente, pela extração ilegal da pele ou por esporte. Um estranho que eles apelidaram de “o dono do Land Rover”, chama a atenção dos caçadores por estar sempre por perto, aparecendo e sumindo convenientemente, como se fosse um espião sugando a experiência e os recursos alheios para conseguir o que quer. Com um documentário potencialmente mais interessante nas mãos, adotando a vertente do cinema-denúncia, os estudantes Thomas, Johanna e Kalle deixam os trabalhadores legais para trás e seguem o suposto criminoso, que parece arredio a princípio, mas logo aceita a ideia da captação do seu trabalho em vídeo, por razões pessoais. O misterioso Hans, conduz a mesma função há décadas e não tem nada a ver com ursos ou nenhuma atividade ilegal, na verdade, ele é monitorado de perto pelo governo Norueguês, que apenas exige que ele seja discreto. Acontece que o caçador da animais muito maiores e fantásticos, está cansado e disposto a revelar a verdade para a população, mesmo que o preço seja o pânico generalizado, no país e no mundo inteiro. 

O Caçador de Trolls está longe de ser um terror tradicional, mesmo que contenha sangue e morte. Ainda que a existência daqueles seres, neste found footage que se apresenta como “genuíno”, implique que criaturas semelhantes possam existir no resto do mundo, no quintal de alguma cidade próxima, representando igual perigo, o tema baseado em contos de fadas escolhido para a história, amortece a loucura que está em perseguir o vilão ao invés de fugir dele. Isso não quer dizer que o filme não consiga provocar medo. Eu não sei quanto a vocês, mas algo sobre monstros gigantes em cenários urbanos, ou que não pertencem ao mundo da fantasia, como castelos e cidades perdidas, por exemplo, realmente mexe comigo. Até as versões mais obsoletas de Godzilla funcionavam bem, por este choque de criatura vs ambiente apropriado. Não estamos em Nova York ou outra metrópole, mas só de ter veículos motorizados em estradas pavimentadas, tentando escapar de gigantes mitológicos, já temos um gostinho da sensação de algo deste calibre acontecendo na vida real. 

Durante o primeiro ataque aos intrusos na montanha cercada por florestas… e por intrusos eu estou me referindo aos estudantes… é impossível pelo desespero geral que a câmera grave alguma imagem do monstro. Um dos carros fica de ponta cabeça e Thomas é gravemente ferido, mas correr é a primeira prioridade e ninguém vê nada, portanto, o grito alarmista que Hans havia dado no meio da confusão: “TROOOOLL”, é obviamente encarado com humor, uma vez é claro, que uma distância segura seja alcançada e os estragos sejam avaliados com calma. A ideia de uma criatura nórdica de histórias infantis, habitando as áreas menos povoadas do país, é um absurdo e não poderia ser comprada de imediato pelos estudantes, principalmente se não há nenhum registro em vídeo. No entanto, a seriedade e o compromisso de Hans, que por saber o que sabe, não se preocupa em ser plausível, já fazem dele um protagonista e tanto para o documentário, que teria seguimento mesmo que aquilo tudo fosse a armação de um maluco. Os três acompanhantes estão amando aquele passeio noturno na floresta e pelo menos este elemento é um clássico do terror, com personagens dentro dele encarando situações perigosas como uma grande aventura. Enquanto isso, o público está tenso, aguardando o inevitável, que seria evitável, se todos os personagens de terror fossem tão sensatos quanto aquele nerd do filme Pânico (1996). O monstro aparece e os sorrisos somem do rosto para sempre, ou pelo menos até o final “em aberto” do filme.

André Øvredal, que mais tarde seria apadrinhado por Guillermo Del Toro, dirige este escandinavo cheio de méritos que precisam ser mencionados. Aquela criatura com um pé na fábula, encontrada na primeira tocaia, na qual o apresentador Thomas, a operadora de áudio Johanna e o cinegrafista Kalle faziam pergunta idiotas, com o único propósito de tirar sarro de Hans, está longe de ser a única, ou o mais perigoso dos Trolls botando terror naquelas montanhas, fazendo com que a caçada dure dias e a história fique cada vez mais divertida. Eu falei dos cenários atípicos, mas a burocracia existente no controle e manutenção daquelas criaturas, assim como qualquer recurso que indique praticidade, em uma atividade mais adequada a um cavaleiro medieval que tem um mago como melhor amigo, contribuem muito para que os monstros sejam vistos como grandes e variados animais, enquanto suas aparências permanecem fiéis às descrições das lendas das quais eles foram extraídos. Os efeitos especiais, caricatos propositalmente em diversas partes, funcionam para o real e para a fantasia. Quando as piadas acabam e a verdade é mostrada para os cineastas, a gente poderia questionar a persistência dos jovens, em ficar ao lado de Hans e permanecer em risco de morte, noite após noite, mas se é tão fácil para o público aceitar a excentricidade dos vilões, por que não concordar que aquela é uma experiência imperdível? Como negar que o assunto é no mínimo interessante? Você sabia que Trolls se transformam em pedra com luz forte? Pois é, esta é de fato a única arma do filme. Você sabia que Trolls são ateus? Ateus extremistas, a ponto de atacar quem esteja cantando músicas de igreja, eu devo acrescentar… Pois é, agora você sabe!

Dois sentimentos são uma garantia para o público durante as caçadas: entusiasmo ao ver a galera subindo a montanha todas as manhãs e apreensão, quando o sol se põe e não sabemos com que tamanho ou quantidade de monstros eles irão lidar naquela noite. Estamos, junto com os universitários, realmente interessados em todas as informações que Hans tem para passar e não importa se as criaturas não existem. No terror, tudo, ou quase tudo é fabricado mesmo! Nem pensamos nisso, somos turistas acompanhando um herói solitário, que rejeita este rótulo com veemência, por acreditar que este é um trabalho como qualquer outro e por estar ansioso para se aposentar. Escutamos atentamente às explicações que não terão utilidade nenhuma fora do filme, enquanto procuramos por qualquer movimento entre as pedras, quando a câmera, que sabiamente só mostra o que consegue captar nos momentos mais frenéticos, aponta para as montanhas. Sim, a imagem da capa do filme, bem enquadrada e tratada, é propaganda falsa felizmente, porque é uma coisa muito boa quando um found footage obedece sua regra primária e permanece amador. A cultura não é familiar e com certeza perdemos algumas piadas internas, ou deixamos passar certos comentários críticos sobre o modo de vida local, mas abraçamos o folclore sem problemas. Além do mais, a insatisfação com instituições governamentais é uma mágoa universal, ficando ao critério do autor a escolha sobre o tipo e o tema da arte a ser usada como protesto.