Há 35 anos, três adolescentes foram assassinadas em uma pacata cidadezinha, no período de uma semana, com uma garota morta a cada dois dias, no período do Halloween, quando o autor dos crimes teria a oportunidade de se esconder atrás de uma máscara nas festas que a molecada organizava. O assassino nunca foi encontrado e a cidade de Vernon segue a tradição do restante do planeta, que é a de desumanizar qualquer tragédia ocorrida há algumas décadas, transformando os locais dos assassinatos em atrações turísticas, nas quais os visitantes não tem problema algum em realizar os passeios usando a máscara infame e os moradores locais reclamam abertamente da baixa contagem de corpos. O engraçado é que, com a progressão do filme, quando temos uma divisão de eras na qual uma se mostra ultrapassada e outra avançada, esta insensibilidade dos ultra-informados modernos, é quase esquecida durante o choque de gerações, contra os que vivenciaram e até celebraram o auge da era do bullying. De qualquer forma, na noite de Halloween deste ano, o medo retorna a Vernon trazido pelo assassino das debutantes, com a morte chocante e inesperada da agora cinquentona, que sempre se preveniu, mas achou que tivesse escapado do matador há muito tempo.
Logo no início, o filme avisa que a direção vai tomar um caminho totalmente inesperado de um slasher habitual. Não apenas pela sequência quase democrática do primeiro assassinato, mas também por uma ideia surgida do nada e jogada casualmente no público, adicionando o elemento mais importante do filme após o terror… a fantasia! De todos os filmes famosos dos anos 80, homenageados com cenas e menções dentro e fora do gênero, quem diria que a maior inspiração para este filme viria de Doc, Marty McFly e uma viagem que entrou para a história do cinema, a bordo do DeLorean. O pior é que tudo apontava para o tema “Viagem no Tempo”, com as constantes comparações entre as épocas, a atenção dada às antigas vítimas, como se elas estivessem prestes a serem mais do que estatísticas trágicas e um sentimento generalizado de melancolia e arrependimento na cidade. Ainda assim, sem o costume de ver carnificina sob a lente da nostalgia, foi realmente uma surpresa, já que nem o trailer deixa estampado, esta opção interessante de combinar sangue, muito sangue, com uma aventura cômica e juvenil.

Como o assassino pode estar de volta, é a pergunta que vai ter que esperar o questionamento mais urgente no filme: Como ele pode ser neutralizado, antes mesmo de causar alguma fatalidade? A heroína em questão se chama Jamie, uma típica Geração Z, que viaja para 1987 sem largar o celular, com pouco planejamento e muita fé, enquanto fugia do assassino da máscara do Max Headroom sem os óculos escuros. O filme é bem violento, não permitindo que a atmosfera de magia abafe o suspense e o perigo, assim como indecente demais para ser apropriado para todo o público. O objetivo da adolescente, é impedir a matança do futuro com a identificação do serial killer no passado e para isso, ela precisa passar por situações arriscadas, garantindo cenas de perseguição que são ansiedade pura. Uma delas, próximo do final, replica de uma maneira bem engenhosa o caminhar lento dos assassinos sobrenaturais da década de 80, com a vítima sendo forçada a ficar quieta e aguardar o inevitável. Contudo, o maior obstáculo no caminho de Jamie, é que ela vem de uma cultura na qual até o mais banal viraliza e tudo é levado a sério, mas ela precisa lidar com a omissão típica de uma época bem diferente, apesar de não tão distante, na qual se podia aprontar com menos medo de câmeras registrando cada movimento.
A frustração da jovem aumenta, quando ela percebe que saber o futuro não tem tanta serventia quanto se espera. Encontrar as antigas vítimas do passado e descobrir que elas eram o terror da escola, deixa evidente que fazer uma lista de suspeitos seria inútil. Felizmente isto não impede que o próprio filme seja misterioso, nos fazendo duvidar de todo mundo, independente das impressões que os personagens tentam passar. O grupo no qual ela se infiltra, contém os alvos do assassino, futuros parentes e aliados, só que as limitações são diversas, de tecnologias que ainda não foram inventadas à tranquilidade irritante… e divertida, de quem está com os dias contados, apesar dos esforços da protagonista. Falando nela neste momento, eu gostaria de parabenizar Kiernan Shipka, a menininha de Mad Men (2007-2015) que eu não reconheci sem pesquisar, pela capacidade de praticamente carregar sozinha o filme em um papel complexo, de alguém que engana na mesma proporção em que fica indignada, sem indícios de falsa fofura ou chatice em excesso.

Não é um filme muito profundo, mas causa uns flashbacks involuntários bem tensos (eu estou falando de você, cena da educação física no ginásio!). Tanto o veículo usado para a ida, quanto o adaptado para o retorno da jovem para a própria época, são baseados em argumentos sem nenhuma base séria. Leveza é a ideia. A grande sacada do filme é que, sem perder o terror de vista e com muito bom humor, promove um clash de gerações do qual ninguém sai ileso, entre os justiceiros sociais e os politicamente incorretos. De um lado temos o comportamento inapropriado, da galera mais despreocupada de todos os tempos. Do outro, uma garota que precisa resolver as diferenças com eles, sem o conforto do clamor por cancelamento nas redes sociais. O mais notável é vê-la reconhecendo as semelhanças entre as gerações. As lições de moral são brandas e a trilha sonora é a melhor possível.
