Peter é uma criança solitária e retraída. A inspiração para seus desenhos espalhados pelas paredes, assim como a única companhia, são os pais. A casa onde eles moram, é enorme! O tamanho dos quartos é o sonho de qualquer pobre. No entanto, algo mais apropriado para uma família de três pessoas, teria evitado muita dor de cabeça. É um imóvel antigo e por esta razão, já é de se esperar que o encanamento e a madeira velha se manifestem com frequência, chamando a atenção, principalmente à noite, quando tudo está calmo. Só que o que Peter e somente ele escuta, é um ruído que não pode ser confundido com outra coisa além de uma tentativa de comunicação. Algo bem característico, como o que sugere o título horroroso do filme em português. Mas se o mau-gosto em traduções, fosse o único problema de Toc Toc Toc: Ecos do Além, eu não estaria tão decepcionada com este grandioso desperdício.

A ambientação é sensacional, nas locações que, decoradas para ilustrar a chegada iminente do Halloween, ainda funcionariam para o terror sem o feriado; assim como a dinâmica familiar, mostrando um lugar onde o dinheiro não sobra para muitas reformas ou móveis modernos, mas também não falta, podendo manter um dos adultos em casa tranquilamente. A relação entre os moradores da casa, também é muito bem ilustrada com o uso de luzes e sombras. Os pais são amorosos e pacientes, mas o menino está sempre desconfortável. Geralmente culpamos uma direção ruim ou atores despreparados pela falta de entrosamento, mas desta vez a inquietação faz parte da história. Mais adiante, descobrimos que o incômodo, bem como diversos sentimentos e ações, não fazem o mínimo sentido. Não exigimos mensagens perfeitamente executadas aqui, mas um pouco de cabimento nunca machucou filme algum. Peter não menciona para os pais, o bullying diário que sofre na escola, o que reforça não apenas o isolamento do menino, como a ideia de que os genitores não são de confiança, mas assim que a entidade na parede, com voz infantil e feminina, começa a se manifestar com clareza, ele finalmente encontra uma confidente encorajadora, ainda que sobrenatural.

Ecos do Além é o primeiro longa de Samuel Bodin e dá para perceber uma certa falta de experiência, na direção inconsistente e no modo como ele conduz o roteiro, de um escritor com tão pouca prática quanto ele. A estrutura é bagunçada. Eventos de grande impacto surgem, ou pelo menos pensamos que eles têm valor, até que são esquecidos e substituídos pela tensão do impactante evento seguinte, que também vira algo morno após o ápice, transformando a narrativa em uma montanha russa com fortes emoções no pico, que não se sustentam na queda e com voltas suficientes para o público parar de se importar com o que pode acontecer. O perigo vem com força, depois morre como se nunca tivesse aparecido. Não é como se ritmos oscilantes fossem uma novidade, mas se o intuito era manter o suspense continuamente, o filme faz exatamente o contrário. Independente de quão ruim seja a situação, não há razão para levá-la a sério, já que logo os ânimos se acalmam. 

O sobrenatural já é absurdo por natureza e aqui ele não “decepciona”, mas é o “natural” do filme que ultrapassa os limites do aceitável. Ações injustificáveis de pais e professores, decisões com os dois pés fincados na burrice, coincidências convenientes e no final das contas, pouco do que foi trabalhado pelos personagens, tem influência no desfecho da história. Personagens não desconfiam do óbvio e quando finalmente acordam, a reação acontece com aquele atraso típico de repórter correspondente em outro país, em um noticiário ao vivo. Corram, meus consagrados! Na última porção do filme, a gritaria e a quebradeira é tanta, que só podemos cogitar uma surdez coletiva e repentina em toda a vizinhança. Todo mundo decide ao mesmo tempo, que só existe um lugar possível para o Grand Finale deste terror, mas a coisa mais estranha acontece: cada um espera sua própria deixa para aparecer, sem atrapalhar a vez de ninguém. Paranormal nunca foi uma característica da qual os fãs exigem explicação, então ele poderia permanecer no campo da fantasia, se o normal não fosse tão ridículo. Se a direção não está levando isso a sério, também não pode exigir que mais alguém o faça.

Vale dizer, assoprando depois de bater bastante, que existe uma abordagem interessante no assunto de familiares tóxicos. Que as atuações tentam burlar a fragilidade do roteiro, para entregar um bom trabalho. Eu recomendo que fiquemos atentos à carreira do competente ator mirim que interpreta Peter, apesar de tudo. O problema é que uma ideia diferente e um bom elenco, não seguram tudo o que está destinado ao fracasso no filme. Existem também (poucos) momentos realmente assustadores, mas a maioria é uma fabricação sem durabilidade, dentro de uma história duvidosa, com as cenas mais fortes fazendo parte de uma fórmula do terror que já dá sinais de desgaste. Eu tive mais medo de um personagem em particular, quando este esteve mais próximo de uma vilania realista, do que quando seus olhos brilhavam e seus movimentos eram sobre-humanos. Piora quando eu lembro que a vilania também foi temporária e sem pé nem cabeça. É mais do que uma boa oportunidade perdida, é um filme que não funcionaria nem para o trash, mas que se acha o último terror da prateleira.